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Veja como é feita a prevenção da transmissão de doenças por transfusão de sangue
Como é feita a prevenção da transmissão de doenças por transfusão de sangue?
Por: Dra. Helem Ferreira Ribeiro (Docente UNAMA)
O termo responsabilidade civil refere-se à necessidade de reparação de um dano causado por uma outra pessoa, mesmo sem a necessidade de que uma ação criminal tenha sido perpetrada (PEREIRA, 1998). No contexto hemoterápico, significa responsabilização pessoal ou institucional por ato transfusional que possa causar dano à saúde do receptor de hemocomponentes ou hemoderivados. Desta maneira, para diminuir custos com indenizações e aumentar a segurança transfusional, é necessário que sejam tomadas diversas medidas para diminuir potenciais riscos causados pela transfusão.
A transfusão de hemocomponentes é uma terapia importante para tratar situações críticas, como hemorragias intensas, reposição de fatores de coagulação, destruição periférica de plaquetas, entre outros (BRASIL, 2015). Apesar da importância desta prática, existe o risco de efeitos adversos, como as complicações infecciosas decorrentes de patógenos, incluindo vírus, bactérias e protozoários causadores de doenças (FUJIMOTO, 2018).
Para diminuir os riscos de transmissão de doenças, todo o sangue doado passa por um rigoroso processo de triagem que envolve três etapas: a triagem clínica através de entrevista com o doador e avaliação de alguns parâmetros hematológicos, a triagem sorológica para diversas doenças, além da triagem molecular para os vírus HIV, HBV e HCV (BRASIL, 2016a).
A triagem clínica tem como objetivo identificar doenças pregressas, comportamentos ou a presença de fatores de risco que aumentem a chance de o doador apresentar doenças transmissíveis pelo sangue. Além de perguntas sobre o estado geral de saúde, são investigados parâmetros hematimétricos básicos, tais como concentração de hemoglobina no sangue e o hematócrito, bem como o peso do indivíduo, para verificar se o provável doador está fisicamente apto à doação de sangue (BRASIL, 2016a).
Ainda durante a entrevista de triagem, será investigado o uso de algum tipo de medicação, realização de cirurgias ou procedimentos odontológicos e endoscópicos, a presença de piercings ou tatuagens, comportamento sexual, uso de drogas, etc. Ao final desta triagem o indivíduo pode solicitar ainda a autoexclusão da bolsa que venha a ser doada caso ache que apresenta algum fator que não torna o seu sangue seguro para ser doado (BRASIL, 2016a).
Os métodos de triagem sorológica requeridos pela legislação atualmente vigente visam diminuir os riscos de transmissão de doenças potencialmente graves de veiculação sanguínea. A triagem sorológica geralmente é feita através de ensaios imunoenzimáticos ligados à enzima (ELISA) ou quimioluminescência, e são investigadas a presença de HIV 1 e 2, HTLV I e II, sífilis, doença de Chagas, Hepatite B e Hepatite C. A pesquisa de malária deve ser feita apenas em áreas onde a doença é endêmica, como na região norte do Brasil (BRASIL, 2016a).
A pesquisa de citomegalovírus (CMV) não é obrigatória para todas as amostras, sendo indicada apenas quando o receptor da bolsa for indivíduo transplantado com sorologia negativa para CMV, ou recém-nascidos filhos de mães CMV negativas (BRASIL, 2016ª). Em relação ao Zika vírus (ZIKV), o ministério da saúde brasileiro emitiu nota técnica recomendando que indivíduos com confirmação de infecção ou que sejam parceiros sexuais de indivíduos com infecção confirmada sejam considerados inaptos para doação por um período de 30 dias após o final dos sintomas (BRASIL, 2016b).
Os testes sorológicos realizados para triagem do sangue doado são ajustados de modo a favorecer a sensibilidade, o que aumenta a ocorrência de resultados falsos positivos (Ferreira, 2013). Desta maneira, é importante que o doador seja informado dessa possibilidade. O doador deve ser ainda informado sobre o período de janela imunológica, tempo da infecção até o momento em que o teste detecta anticorpos contra aquela doença. Nesse caso, mesmo um teste negativo, o ato transfusional pode contaminar o receptor durante a transfusão.
A última triagem feita é a triagem molecular, onde serão buscados os genomas dos vírus HIV 1 e 2, HBV e HCV. Este teste é feito através de um pool de seis amostras que serão submetidas a um PCR multiplex, num teste conhecido como Triagem de Ácidos Nucleicos (NAT). Este método diminui a janela diagnóstica, pois sua sensibilidade é ainda maior (BRASIL, 2016a).
Mesmo após a triagem e a utilização da bolsa, é necessário que haja uma vigilância de eventos adversos outros além da contaminação por patógenos. Reações transfusionais de diferentes naturezas precisam obrigatoriamente ser notificadas ao ministério da saúde através de um sistema chamado NOTIVISA. A hemovigilância inclui ainda o monitoramento da soroconversão de indivíduos até 120 após o recebimento de hemocomponentes.
Mesmo com todas essas medidas de segurança, o risco associado à uma transfusão sanguínea sempre existe. Em 2018, uma menina com leucemia no Acre recebeu sangue contaminado com HIV e foi infectada por este vírus, mesmo após a bateria de triagem (G1, 2018). A identificação deste evento só foi possível através da rede de hemovigilância. Assim, mesmo que seja impossível zerar o risco ao receptor de hemocomponentes, é possível aumentar a segurança e garantir a rastreabilidade do processo hemoterápico, gerando responsabilização caso erros sejam cometidos.
Referências bibliográficas
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 1998.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Especializada. Guia para o uso de hemocomponentes. (Serie A. Normas e Manuais Técnicos). 2ª edição. Brasília: Ministério da Saúde, 2015
FUJIMOTO, Denys Eiti. Risco residual de transmissão por transfusão das hepatites B e C na coorte de doadores de sangue do estado do Acre. 2018. Tese de Doutorado.
BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 158, de 04 de fevereiro de 2016. Redefine o regulamento técnico de procedimentos hemoterápicos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 05 fev. 2016. Seção I, p. 37.
FERREIRA, Antonio Walter; MORAES, Sandra do Lago. Diagnóstico laboratorial das principais doenças infecciosas e autoimunes: correlações clínico-laboratoriais. 3ª edição. Guanabara Koogan. 2013.
BRASIL. Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária e Ministério da Saúde. Nota técnica 002/2016 de 18 de Agosto de 2016. Critérios técnicos para triagem clínica de candidatos à doação de sangue para os vírus Zika e Chikungunya. Disponível online em https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2016/agosto/25/Nota-Tecnica-Conjunta-002-2016-zika-e-chikungunya-CGSH-ANVISA.pdf. Acesso em 06/11/2019.
CRIANÇA é infectada com vírus HIV após transfusão de sangue e Hemoacre diz que caso é ‘fatalidade’. G1. 2018. Disponível online em https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/crianca-e-infectada-com-virus-hiv-apos-transfusao-de-sangue-e-hemoacre-diz-que-caso-e-fatalidade.ghtml. Acesso em: 06/11/2019.
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