UNAMA | Ser Educacional Unama
18 Janeiro
Belém
Os novos pinguins do século XXI no Brasil
Autor: Amadeu Vidonho

José Maria Eiró Alves[1]

 

1. A CHEGADA

O ingresso em uma IES no curso de Graduação em Direito significa a abertura para novas possibilidades de aprendizagem e fazer um Curso Superior no Século XXI é bem diferente do que se via até meados dos anos 90 do Século XX, sobretudo no tocante ao acesso às informações, velocidade e fluidez das práticas e necessidade de atualização constante, para dar respostas à realidades complexas e diversas.

Neste cenário, receber alunas e alunas que precisam se colocar como produtores do próprio conhecimento, pois já são fazedores de seus próprios caminhos. Aqui chegaram e aqui permanecerão construindo suas trajetórias e transformando-se, diariamente, em sujeitos de direito mais capacitados a defender seus legítimos interesses, para, no futuro, cuidar da prática jurídica em toda sua intensidade.

Não pretendo falar muito do óbvio no que diz respeito à fixação pela aprovação no Exame de Ordem! Digo, apenas o seguinte: este degrau, importante para a carreira, deve ser encarado como consequência daquilo que se faz desde o ingresso na Academia! Organizar o estudo, direcionar a energia, focar desde o início do curso para que à medida em que os semestres avancem, do mesmo modo seja maior o aprendizado e a agregação de conteúdos, habilidades e competências teóricas e práticas capazes de dar sustentação para a produção de raciocínios que habilitem para o sucesso na prova objetiva e prova prático-profissional.

Por aqui é suficiente dizer que, grosso modo, as maiores expectativas dos estudantes de direito, sem aqui preocupar-me com a hierarquia destes desejos, seja: a aprovação no Exame de Ordem; o ingresso no mercado de trabalho, com foco muito concentrado nos concursos públicos no âmbito do Legislativo, Executivo, Judiciário;  carreiras na iniciativa privada como consultores, pareceristas, advogados; a advocacia privada ou pública, em diversas áreas de atuação; a magistratura, a carreira como promotor de justiça, procurador autárquico, procurador municipal, estadual, federal; a atividade acadêmica, como professor e pesquisador; iniciativas relacionadas à advocacia popular; atuar no mercado como empreendedor, propondo inovações em termos de produtos.

Mas, observe: estás descobrindo um novo mundo... temas, teorias, propostas de intervenção sociojurídicas, enfrentamento do ideal (dever-ser) e do real (ser), que, para o leigo, em muitas ocasiões, impedem ver a beleza e a necessidade do direito como instrumento de balizador normativo da sociedade, justamente pelo fato de que o indivíduo não pode ser considerado mais importante do que o coletivo. É por isso que as escolhas sobre o caráter permitido ou proibido das condutas não podem ficar a mercê da decisão de cada pessoa. Tem de existir um comando externo, baseado na política, do debate, na fundamentação histórica sobre os direitos humanos e suas implicações no plano social.

Logo, viver, conviver e constituir-se como um sujeito científico exige o reconhecimento da importância do caminho individual, tocado pelo coletivo, que constitui pessoas que jamais estarão totalmente prontas, pois até o último segundo de vida estaremos em processo de aprendizagem e jamais haverá alguém capaz de olhar e compreender todo o horizonte...

A presente proposta destina-se a colaborar com a formação inicial dos Acadêmicos e permitir o desenvolvimento de habilidades e competências necessárias ao percurso formativo da Graduação, permitindo maior capacidade de diálogo interdisciplinar, seja no âmbito das disciplinas jurídicas, bem como quanto à relação que o Direito possui com áreas afins como Filosofia, Sociologia, Ciência Política, Teoria do Estado, Antropologia, Linguagens, Comunicação, Arte e Literatura.

Para isto, segue o item 2, com as sugestões de atitudes colaborativas para melhorar o percurso acadêmico e colaborar para a construção de um bom currículo.

2. O CAMINHO

Não se faz um bom marujo sem navegar... os maiores compositores têm a marca da criatividade como destaque para fazer letras e melodias originais... os melhores escritores usam da imaginação para criar personagens, enredos, contextos capazes de fazer de seus textos verdadeiras obras de arte... os melhores esportistas têm na dedicação, repetição e extrema disciplina quanto à técnica e ao preparo físico os elementos que constituem um super-atleta.

Já chegaste ao mundo (a maioria de nossos atuais alunos) inserido na tecnologia informacional e o uso de plataformas e aplicativos nos smartphones, notebooks e computadores é algo incorporado ao dia a dia das pessoas que se encontram num patamar mínimo de inclusão digital. Ser do Século XXI é isto: estar conectado e usufruir das informações e possibilidades que a internet e as plataformas digitais possibilitam.

E para o Bacharelando em Direito? Qual deve ser o caminho a seguir?

Um pouco de criatividade, imaginação, dedicação à apreensão das bases humanísticas é imprescindível para que o estudo da técnica jurídica, dogmática por excelência, seja desenvolvido de modo racional e ético, compreendendo o aprendente como um sujeito histórico e dialeticamente envolvido na comunidade a qual pertence, integrante das problemáticas sociojurídicas que será convidado a analisar ao longo do percurso acadêmico e no futuro profissional.

Por isto é tão importante o desenvolvimento (ideal seria aprimoramento) do hábito da leitura. Recomendo a leitura semestral, no mínimo, de um romance, uma obra literária que não integre as leituras de textos e obras das disciplinas do curso. Aguça a curiosidade, amplia o vocabulário e permite contato com a literatura como mecanismo de captação do real ou manifestação de desejos de como a sociedade poderia ser melhor ou pode ter o caráter de denúncia de problemas sociais.

Outro ponto importante é o cuidado com o corpo (boas noites de sono, descanso adequado, atividades físicas ao ar livre sempre precedidas de orientação médica) e a mente (interação social adequada, diálogo com iguais, parcerias que geram sensação de pertencimento e inclusão e o acolhimento gerado pela participação em atividades grupais de caráter artístico, cultural, acadêmico, social, sem deixar de considerar a importância do psicólogo/terapeuta como forma de compreender-se melhor e favorecer práticas cada vez mais salutares).

Somente agora, chego ao ponto de tratar do currículo, que deve ser pensado desde o início do curso: atividades complementares não podem ser uma mera exigência institucional! Até o terceiro ou quarto semestre (sugestão), o aluno deve se oportunizar participar das mais diversas palestras, mesas de discussão, oficinas, seminários, simpósios, sem preocupar-se com o direcionamento para uma área específica. Explico: os semestres iniciais servem, também, para conhecer o curso, ambientar-se nas disciplinas introdutórias (sobretudo primeiro e segundo períodos) e iniciar o processo de compreensão dos conteúdos dogmáticos da CRFB, dos Códigos, das Leis e compreender o papel da jurisprudência na interpretação e aplicação do direito controvertido, o que será de fundamental importância para a futura escolha de tema para a inserção em Grupos de Estudo, participação em Iniciação Científica, Monitoria, e a futura elaboração do artigo científico exigido na disciplina Trabalho de Curso.

Logo, pelo exposto, o caminho, se bem trilhado, vai permitir o acréscimo necessário de experiências aptas ao desenvolvimento de um sujeito integrado e integral, capacitado a propor soluções para problemas jurídicos com sensibilidade e ética, valorizando a democracia, a diversidade, a pluralidade e os direitos humanos como pressupostos inafastáveis que estão diretamente alinhados com o que se espera dos principais atores forenses: Advogados, Juízes e Promotores, bem como de todo cidadão e cidadã consciente de seu papel político em colaborar na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, como estabelecido no texto constitucional.

3. A VITÓRIA

Apesar de vivermos em uma sociedade hiperconectada, cujas demandas prescindem cada vez mais de nossa presença física e nas quais os relacionamentos são muito líquidos (BAUMAN, não poderia deixar de usá-lo), acredito que o sucesso pessoal e profissional é muito particular... Neste sentido, creio que sempre é adequado estabelecer que não existe um paradigma exclusivo para definir a felicidade individual.

É lógico que utilizar de exemplos positivos, de trajetórias de vida marcadas pela superação de dificuldades é um recurso poderoso para percebermos que mesmo diante de obstáculos, é possível obter vitórias (com maior esforço, jogando contra o sistema) que, ao final, terão um sabor ainda melhor.

Desejo destacar, entretanto, que a medida de cada um é sempre a sua origem e trajetória, tudo o que teve de ser enfrentado, notadamente para quem é oriundo de uma realidade socioeconômica de maior dificuldade, para marcar uma individualidade marcada pela insurgência e resistência, para a qual o estudo, a dedicação e a entrega a um sonho de ascensão intelectual e econômica marcam a realidade de inúmeros jovens, adultos e pessoas maduras que iniciam o Curso de Graduação em Direito.

Nas palavras de WARAT somos todos “pinguins”, pois desejamos, ardorosamente, usar paletó. O saudoso argentino fazia referência aos estudantes de direito usando a metáfora dos pinguins, dada a indumentária e o jeito típico de andar, marca do formalismo e do aprendizado bancário (tão criticado por FREIRE).

Desejo que, ao final da graduação vocês sejam “pinguins” apenas nos trajes, pois são sabedores que, nascidos no Brasil, nativos da Amazônia, do Pará e de Belém, o papel de cada um é saber bem usar o vade-mécum, a jurisprudência e a doutrina com a cabeça cheia de boas possibilidades de aplicação do direito e de reflexão sobre os velhos e os novos problemas jurídicos, pois a vida, como o direito é sempre dinâmica e não pode admitir retrocessos, nem cabe, em sua integralidade, na lei ou jurisprudência!

O sonho precisa de atitude para tornar-se realidade!

Ao trabalho, Prezadas Alunas e Prezados Alunos.

Sejam felizes na UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA!

 



[1] Professor Universitário. Bacharel e Mestre em Direito pela UFPA. Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Linguagens e Cultura da UNAMA.

 

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